Como qualquer instituição que se paute por padrões de rigor e transparência, no que respeita ao seu funcionamento e relacionamento com os demais intervenientes, no âmbito das suas atividades, também a sociedade, enquanto tal, obedece a regras e comportamentos que integram a própria organização política, configurando um Estado, este entendido como uma estrutura funcional, que superintende, através de diversos órgãos do poder, na regulação e fiscalização das atividades que a sociedade desenvolve com fins públicos ou privados, no centro da qual está o cidadão, como pessoa de deveres e direitos, que participa nos órgãos da administração pública, quando está no exercício de uma cidadania democrática.
A organização política do Estado, consignada na respetiva Constituição política, estabelece as grandes linhas de orientação, a partir das quais se desenvolve todo um processo dinâmico, sempre em aperfeiçoamento, em ordem à produção de legislação, sua aplicação e fiscalização, no sentido de dotar o país das condições que conduzam à melhoria da qualidade e nível de vida da população.
O homem tem revelado necessidade de se organizar, sob as mais diversas formas, e para diferentes finalidades. Ao longo dos últimos vinte e cinco séculos, a organização política tem sido objeto de inúmeras teorias, suportadas em ideologias, com objetivos e meios descritos como os que melhor satisfazem os interesses da sociedade, que do anarquismo ao absolutismo são defendidos por uns e por outros. Na circunstância, importa deixar algumas referências de organizações políticas e constitucionais no espaço luso-brasileiro.
Atualmente, no Brasil: "A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios, todos autónomos nos termos desta Constituição."; em Portugal, o território está organizado conforme: "historicamente definido no continente europeu e os arquipélagos dos Açores e Madeira" e a divisão do espaço está estabelecida em Províncias, Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, Regiões Administrativas, Distritos, Municípios e Freguesias. (cf. CONSTITUIÇÕES BRASILEIRA e PORTUGUESA)
Naturalmente que, em cada um dos países, a organização político-administrativa compreende um determinado número de órgãos constitucionais, políticos e administrativos, que dão corpo a toda a organização do Estado, não cabendo aqui: a descrição de todos eles; sua estrutura, funcionamento e objetivos. Importa assim ter a noção de como os dois países irmãos estão organizados politico-administrativamente.
A inexistência da freguesia, no Brasil; e de estados em Portugal, são diferenças significativas, entre outras que, em ambos os sistemas políticos, podem ser consideradas importantes. Em todo o caso e como se defende em capítulo próprio, o cidadão luso-brasileiro, que aqui se idealiza, e no que se refere à sua participação política, na organização do Estado, preparar-se-á, politicamente, a partir do exercício de cargos públicos, nas estruturas da administração político-administrativa, na interiorização dos problemas locais, no terreno, nos órgãos do poder local que, em Portugal são as regiões administrativas, os municípios e as freguesias e no Brasil os municípios
Este cidadão, numa perspetiva de boa formação política e administrativa, teria toda a conveniência em iniciar-se, sem quaisquer complexos, na autarquia local, ao nível da Freguesia, por ser aquela que direta e diariamente lhe proporciona um contacto pessoal com as realidades existentes, um "frente-a-frente" permanente com a população, uma impossibilidade de se refugiar noutros órgãos mais abstratos, em termos de intervenção no terreno. É possível defender um cidadão sensibilizado e preparado para lidar democrática e civicamente com o povo, no respeito, na tolerância, na solidariedade, todavia, com firmeza.
A dimensão política do homem comporta, necessária e indissoluvelmente, o exercício do poder, seja do poder paternal ao poder político, o ser humano, ao longo da sua história mais recente e conhecida, nos dois últimos milénios, pelo menos, sempre se revelou interessado no exercício do poder, muito embora nem sempre tal interesse tenha servido para resolver os problemas daqueles a quem e sobre quem exerceu um determinado poder.
Modernamente, atento os regimes democráticos de realização da cidadania, o poder pelo poder, com objetivos de satisfação de interesses privados, é inaceitável e deve ser legal e legitimamente combatido, porque a dimensão política do homem deve conduzi-lo ao acesso e exercício do poder ao serviço da comunidade, com objetivos bem claros, bem planeados, programados e atingidos. A nobreza da política conduz ao serviço público, à satisfação das necessidades, à progressiva redução dos desnivelamentos existentes nas atuais sociedades.
O cidadão luso-brasileiro, que mais à frente se caracterizará, será formado para usar a sua dimensão política, desde logo de acordo com a sua boa consciência, conhecimentos e experiência, mas também no respeito pelas leis do seu país, com especial atenção à respectiva Constituição Política. Nos regimes políticos democráticos, como felizmente são os que vigoram em Portugal e no Brasil, todo o poder irradia do povo, que através de eleições livres, democráticas, transparentes e justas, elege os seus representantes para os órgãos próprios do poder.
Nestas circunstâncias, o povo espera dos seus eleitos a melhor prestação para o bem público, e dispõe da capacidade legal de sancionar, positiva ou negativamente, o desempenho do seu mandatário, em próximo ato eleitoral, retirando-lhe, ou não, através do voto, a confiança antes depositada, se for essa a situação.
Exercer o poder, com espírito de missão e de serviço público, é uma tarefa que enobrece e enriquece o cidadão mas que, regra geral, é complexa, difícil e muitas vezes incompreendida, injustamente atacada e desapoiada por quem tinha o dever de se solidarizar. Mas o poder também desgasta, corrompe e, em situações limite, pode conduzir à eliminação do indivíduo que o exerce, quer pela doença, quer pela via judicial.
Numa outra perspetiva, conhecem-se, também, os efeitos do exercício do poder quando, através dele, os seus detentores o usam para protagonismos pessoais, alimentação de vaidades próprias, vinganças sobre pessoas, entidades, organizações e adversários políticos; prepotência, arrogância e humilhação dos que ousam criticar tais formas de abuso do poder.
Ainda que de uma forma simples mas objetiva, quando se analisam várias situações resultantes do desempenho de funções políticas, ao nível do poder executivo, o que se retira, de modo concreto e objetivo, é que quem exerce o poder, nem sempre resolve os problemas mais candentes, como aqueles que se prendem com: a miséria, a educação, a saúde, a habitação, a segurança, o emprego, a valorização e dignidade da pessoa humana.
O cidadão que se dá a conhecer através deste trabalho, que emerge de um espaço bem determinado: Brasil-Portugal com início numa época muito difícil, conflituosa e preocupante, como tem sido este início do século XXI, será sensibilizado, educado e formado para o exercício do poder político democrático, onde os grandes valores universais sejam a cartilha permanente, pela qual se orientará.
E se o exercício do poder decorrer a tempo inteiro, remunerado e recompensado com benefícios de outra natureza, então esse cidadão não pode eximir-se à responsabilidade total e absoluta, tem de oferecer aos governados a máxima competência, dedicação, isenção e permanente atualização: quer de conhecimentos; quer de procedimentos; quer de objetivos.
Pelo contrário, ao cidadão que desempenha um determinado cargo, para o qual se candidatou e foi eleito, mas não o exerce a tempo inteiro, nem tem qualquer remuneração pela qual lhe permita viver com dignidade, e muito embora lhe seja exigida competência, dedicação, isenção e responsabilidade, não se lhe pode impor obrigações que prejudiquem a sua saúde, a sua família e a sua atividade profissional.
Este cidadão que se pretende para o século XXI, desde já a exercer o poder no espaço luso-brasileiro, estará consciente de todas estas situações, e agirá sempre nos legítimos interesses coletivos, sem descurar o exercício dos direitos que lhe assistem como cidadão, com vida própria e interesses legais próprios.
O exercício do poder político pressupõe qualidades, virtudes, capacidades e disponibilidades muito específicas e, nesse sentido, defende-se um novo tipo de político, ao qual se exija uma postura diferente da que tem sido observada em muitos políticos.
A dimensão política do homem é demasiado séria e importante para descer ao nível da demagogia, do populismo, da exibição da vaidade supérflua e efémera, como transitório é o poder e, regra geral, todos o cargos obtidos por eleição, porque: "(…) a um político que pretende ser fiel aos princípios Cristãos (ou de outras religiões) não basta (suposta sempre a competência profissional) que respeite esses princípios e tenha em vista o bem comum através da acção partidária: é necessário também que seja cristão nos processos que utiliza na actividade política. A calúnia, a mentira, o ódio, a violência, os conluios desonestos, as promessas que sabe de antemão não poderem ser cumpridas, não podem fazer parte dos métodos políticos de um discípulo de Cristo." (DICIONÁRIO POLÍTICO, 1974:284).
Conhecem-se, desejam-se e aplaudem-se, hoje, os avanços científicos e tecnológicos, mas salvaguardando-se que os seus resultados possam ser equilibradamente aplicados e controlados. Quem exerce o poder, seguramente está atento a estes novos sinais dos tempos modernos e, na medida do possível, é compreensível que pretenda retirar os melhores proveitos. Igualmente se entende a preocupação, por parte dos políticos executivos, de integrarem nas suas equipas, o maior número de técnicos qualificados em diversas áreas do saber, para evitar o improviso, a solução pontual que não resolve o problema de fundo.
Evidentemente que o facto de um determinado Governo ser mais tecnocrata do que outro, isso não significa que será melhor ou pior Governo, porque tudo dependerá dos objetivos a atingir e das necessidades mais prementes da população que devem ser satisfeitas.
Obviamente que não haverá governos perfeitos, que dominem e resolvam completamente todos os problemas da sociedade, admitindo-se que alguns setores podem ser mais trabalhados e os resultados mais favoráveis e, noutras áreas, haver alguma negligência, intencional ou involuntária, onde os resultados ficam aquém das carências existentes.
O cidadão que tiver a responsabilidade de constituir equipas governativas, seja qual for o nível do exercício do poder, deverá ter em atenção que: "A bitolação de um sistema político que busca seus impulsos apenas na área das determinações tecnológicas e do imperativo da sobrevivência, sublimando-se, assim, em relação à esfera da interacção social, tal qual num arcano inacessível tanto cognitiva quanto motivacionalmente, produz os factores de ameaça a si próprio, gerando a alienação política." (DREITZEL, 1975:79).
Vale esta reflexão para o Poder Local Democrático, logo no primeiro e dignificante nível: o espaço e a pequena comunidade da freguesia rural em Portugal, cujo poder político, eleito por sufrágio direto e universal é a Junta de Freguesia, órgão de poder que funciona, como "Posto de Primeiros Socorros" na solução de pequenos problemas da comunidade, emissão de documentação individual para resolver situações dos cidadãos.
Bibliografia
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL (CF/88), in LOPES, Maurício António Ribeiro (Coord.), (1999), 4ª. Ed., revista e actualizada, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, (2004), Versão de 2004. Porto: Porto Editora.
DICIONÁRIO POLÍTICO, (1974). Os Bispos e a Revolução de Abril, Lisboa: ISPAGAL
DREITZEL, Hans-Peter, et al. (1975). Tecnocracia e Ideologia, Trad. Gustavo F. Bayer, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo